O Poder Judiciário diante da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso das Comunidades Quilombolas de Alcântara: possibilidades de reconstrução institucional à luz do experimentalismo judicial
DOI:
https://doi.org/10.46901/revistadadpu.i24.p53-83Palavras-chave:
Consulta prévia, livre e informada, Corte Interamericana de Direitos Humanos, Experimentalismo judicial, Participação, Mesa de diálogoResumo
Este artigo busca examinar em que medida as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) podem servir como referências normativas e interpretativas para o sistema de justiça brasileiro na implementação efetiva dos direitos coletivos em contextos de conflito socioambiental, como o caso de Alcântara. A análise se enquadra na perspectiva teórica do experimentalismo judicial, modelo que defende arranjos institucionais flexíveis, inclusivos e sujeitos a revisão contínua para enfrentar litígios estruturais. O estudo destaca como a instalação e a expansão do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), conduzidas sem diálogo com as comunidades afetadas, resultaram em violações reiteradas de direitos, culminando na condenação do Brasil no Sistema Interamericano. A sentença da Corte IDH impôs medidas como a criação de uma mesa de diálogo permanente entre as comunidades e o CLA, a obrigação de realização de consulta prévia em futuros projetos e o monitoramento participativo de impactos socioambientais. Argumenta-se que o Judiciário, por meio do diálogo institucional, pode assumir papel central na efetivação das reparações ordenadas pela Corte IDH, garantindo transparência, participação e reconstrução institucional. A experiência de Alcântara, portanto, não deve ser vista apenas como condenação internacional, mas como oportunidade para repensar a atuação jurisdicional em litígios socioambientais complexos. Conclui-se que o experimentalismo judicial pode servir de referencial teórico e prático para o avanço da implementação de direitos coletivos no Brasil, abrindo espaço para arranjos mais participativos e responsivos às demandas das comunidades tradicionais.
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